quinta-feira, 10 de junho de 2010

002-Primórdios


É verdade que a chamada Era do Rock começou precisamente em 9 de julho de 1955, quando "Rock Around the Clock" com Bill Haley começou seu reinado de oito semanas no primeiro lugar da Billboard, ou seja, quando todos os EUA e, por tabela, o mundo ficaram sabendo da existência desse tal de rock and roll. Também é verdade que tal gênero musical ganhou o nome "rock and roll" por cortesia do DJ norte-americano Alan Freed (1922/1965), que, empolgado com o ritmo, promovia programas de rádio e bailes chamados "Moondog Rock And Roll Parties" desde 1952.

Mas o rock and roll, como música e como movimento cultural e de comportamento, é uma das melhores demonstrações daquela bela frase: se uma pedra se parte ao meio após levar cem marteladas, o mérito não cabe somente à centésima martelada, mas também às outras 99.

Pois bem, o megasucesso de "Rock Around The Clock" em 1955 foi a centésima martelada;




o cantor, guitarrista e band-leader Bill Haley (1925/1981) gravou e lançou o disco 1954, fazendo sucesso apenas razoável, só pegando fogo de verdade quando os autores da música (de quem falaremos mais para a frente) deram um jeito para que a gravação entrasse no filme Blackboard Jungle (filmado por Richard Brooks a partir de um romance homônimo de Evan Hunter). "Rock Around The Clock" só aparece tocando por cima dos créditos iniciais




(o romance, embora sobre delinquentes juvenis, os mostra como fãs de jazz), mas foi o suficiente. E a gravação de Haley nem é a original: quem primeiro gravou a música foi uma certa Sunny Dae em 1952 e o disco acabou tão obscuro quanto ela própria.


Se, para o grande público, "Rock Around The Clock" com Bill Haley parecia tão original a ponto de causar alvoroço nos cinemas só por tocar sobre os créditos iniciais de um filme, os fãs de country devem ter-se divertido: experimente comparar a gravação de Haley com "Move It On Over", sucesso de Hank Williams de 1947.



 Além da melodia ser praticamente a mesma, a gravação de Hank já tem quase todos os elementos geralmente reconhecidos como características do rock and roll: melodia simples porém eficiente com escalas e harmonia inspiradas no blues, solos instrumentais ríspidos, veloses e/ou expressivos, vocal agressivo e/ou sensual, bateria bem marcada e contrabaixo e guitarras (e/ou violões) pulsantes. (A marcação característica da bateria, acentuando o segundo e o quarto tempos, é o único detalhe ausente de "Move It On Over" - mas, reparando bem, é um detalhe também ausente nos primeiros discos de Elvis.)


Já estamos começando a ver que de novo o rock and roll só tinha o nome - e mesmo assim, o próprio nome de novo não tinha muito "Rock (balançar) and roll (rolar)" era gíria corrente entre os negros norte-americanos desde pelo menos os anos 20 deste século, para designar o ato sexual. Um dos primeiros discos da cantora de blues Trixie Smith (1895/1942) chamou-se justamente "My Daddy Rocks Me (With A steady Roll)", traduzível como "Meu papai me balança com um rolar constante", isto em 1922. Um filme razoável de 1934, Transatlantic Merry-Go-Round, de 1934, inclui as Boswell Sister (grupo vocal branco de sucesso nos anos 30-40) cantando um número chamado, adivinhe só, "Rock And Roll".



E imaginem a cara de assombro dos pesquisadores de floclore John e Alan Lomax (pai e filho) ao descobrirem, no mesmo ano de 1934, um grupo negro cantando uma canção religiosa afro-americana das mais antigas, "Run Old Jeremiah", de ritmo enérgico e melodia e letra possessas: "Oh my Lord/Well, well, well/I've gotta rock/You gotta rock/Wah wah ho..."  


(Veja a letra completa)
A grande importância de Alan Freed foi justamente ter sido quem mais ajudou o rhythm and blues (já vou explicar que bicho é esse) negro a se tornar aceitável (e como!) para os brancos, já que, como ninguém é perfeito, um dos grandes pecadilhos do povo norte-americano até os anos 50 era o racismo mais que explícito. O rock and roll, como o cinema, o automóvel e todas as grandes invenções, não pode ser atribuído a um único inventor - as grandes idéias nunca vêm de uma cabeça só. Do mesmo modo, o rock and roll não nasceu de uma única fonte, ou mesmo duas, embora seja definível, a curto e grosso modo, como uma combinação de country e blues. Bill Haley sempre declarou que formou seu estilo ao acentuar o segundo e quarto tempos da marcação em 4/4 do country; esta foi apenas uma das descobertas que levaram a definir e carcterizar o rock and roll. A data mais comumente aceita como a da criação do rock and roll é a do lançamento da música (We’re Gonna) Rock Around The Clock de Bill Haley and The Comets, em 12 de Abril de 1954, embora dezenas de gravações anteriores já apresentassem um ou outro fator do que viria a se cristalizar como rock and roll (o próprio Bill Haley havia gravado no mesmo ano, um pouco antes, a música Shake Rattle and Roll).




O rock and roll é um produto típico de seu país de origem, país estereotipado como prático demais e culto de menos, mas sempre habilidoso em imitar, reproduzir, reciclar e divulgar mundialmente a cultura do mundo todo - especialmente após as duas grandes guerras mundiais, quando o governo teve a idéias da "política de boa vizinhança": é mais bonito, e mais sutil, conquistar pelas idéias que pelas armas. Herdeiros da índole imperialista e paternalista dos britânicos, os norte-americanos acabaram tomando conta do mundo, só que menos pela força física que por artefatos de agrado geral que criaram ou divulgaram, como o cinema de Hollywood, o hamburger, o Cadillac, o chiclete, o jazz e, claro, o rock and roll.


Descobertos no século XVI, existentes como nação desde 1607, independentes desde 1776, os EUA só começaram a ter manifestações culturais com características próprias desde o século XIX, com escritores como Brancoft, Melville e Jack London, pintores como Whistler e Rousseau e compositores como os que veremos em breve.


Pois bem, vamos finalmente conhecer os pais e avós do rock and roll, um por um:
 

Na próxima página você verá Os Cantos dos Escravos...


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